quinta-feira, 19 de abril de 2012

ENTREVISTA COM A PRESIDENTA DA SBPC HOJE NA "FOLHA DE S.PAULO"




ENTREVISTA - HELENA NADER

Governo ignora cientistas em debates importantes

PRESIDENTE DA SBPC, PRINCIPAL ÓRGÃO CIENTÍFICO DO PAÍS, DIZ QUE AVANÇO DA PESQUISA NACIONAL NÃO A TORNOU INFLUENTE

(foto acima: Eduardo Knapp/Folhapress)
In: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ciencia/37939-governo-ignora-cientistas-em-debates-importantes.shtml )


SABINE RIGHETTI
DE SÃO PAULO
Justamente agora que o Brasil atingiu a 13ª posição na produção científica mundial, aumentou a quantidade de universidades federais e o número de pesquisadores, o país deu um "tiro no pé" reduzindo em 22% os recursos federais para ciência, diz a biomédica Helena Nader.

Para a presidente da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência), o governo erra ao ignorar o que a ciência nacional tem a dizer nos debates públicos sobre temas importantes, como o novo Código Florestal ou a conferência Rio+20.



Folha - Na semana passada a presidente Dilma afirmou que os cientistas deveriam ser avaliados também por patentes, além de produção científica. O que a sra. pensa disso?
Helena Nader - A universidade até pode fazer patente, mas esse não é o seu papel. O grande produtor de patentes deve ser a iniciativa privada. A Capes [Coordenação de Pessoal de Nível Superior] hoje pontua programas de pós-graduação com patentes. Mas querer que a universidade se responsabilize por patentes é um erro, mesmo que sejam feitas em parcerias com empresas. Essas parcerias ainda são muito frágeis.

Por que são frágeis?
As leis são problemáticas e deixam o cientista em uma posição vulnerável. Há problemas na interpretação das leis, como a Lei do Bem [de 2005, que trata prioritariamente de pesquisa em empresas]. Hoje, um professor com dedicação exclusiva em uma universidade pode, pela legislação, dedicar um dia por semana para um projeto em parceria com uma empresa. Mas isso pode causar problemas no Ministério Público, que entende que ele está deixando de fazer pesquisa e ensino. O professor concursado pode colocar em risco a carreira dele. Precisamos de uma legislação mais clara.

O Código Nacional de Ciência e Tecnologia, que tramita no congresso desde setembro do ano passado, resolveria isso?
Essa proposta é fantástica. Mas o texto ainda está sendo aprimorado [o texto compila leis atuais ligadas à pesquisa, relacionadas por exemplo à importação e compra de equipamentos]. A questão é que no Brasil as empresas multinacionais quase não fazem ciência, diferentemente do que acontece na Índia e na China. O Brasil precisa ter mais pesquisa e desenvolvimento nas empresas.

Mas as empresas costumam alegar que falta mão de obra para fazer pesquisa no Brasil.
Houve um aumento grande no número de cientistas nos últimos 20 anos, mas ainda não foi suficiente. No entanto, aqui temos cientistas de primeira. Nós não existíamos como ciência pesada há 20 anos! Isso aconteceu nas universidades e nos institutos de pesquisa. E não adianta dizer que os cientistas das universidades são voltados à ciência básica [produção do conhecimento] e não à ciência aplicada [que gera produtos e inovações] porque essa polarização é fictícia. As duas formas de pesquisa se complementam.

A SBPC tem se manifestado recorrentemente em relação ao corte de 22% de recursos federais à ciência. Houve algum retorno do governo?
Por enquanto, nada. Só se essa resposta estiver sendo formulada agora, enquanto estamos conversando (risos). E os números dos cortes ainda serão piores. Se o PIB (Produto Interno Bruto) crescer, a porcentagem destinada à ciência ficará menor ainda. O "PAC da Ciência" previa 1,8% para ciência em 2015. Isso não vai acontecer. Nós tiramos o chapéu quando o presidente Lula criou universidades federais. Essas instituições têm professores com, no mínimo, doutorado. Agora que a ciência tem força, nós cortamos o dinheiro?

A SBPC também tem brigado para alterar o texto do Código Florestal, que deve ser votado na semana que vem. Os cientistas estão sendo ouvidos?
Os cientistas não são ouvidos pelo governo porque não temos uma "bancada de cientistas" no Congresso, como têm os ruralistas. A ciência nacional cresceu e se fortaleceu, temos pesquisadores sendo disputados por instituições de pesquisa respeitadas em todo o mundo. Agora os cientistas deveriam ser ouvidos. Nós temos uma proposta para o Código Florestal, assim como temos um material que levaremos para discussão na Rio+20. Deveríamos ser mais ouvidos.

terça-feira, 17 de abril de 2012

CONTRA O CORTE NO ORÇAMENTO DE C&T



Membros do CCT apoiam manifesto contra corte no orçamento do MCTI

No dia 4 de abril, membros do Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia (CCT) e representantes da sociedade civil declararam publicamente apoio ao manifesto que pede a revisão do corte no orçamento do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI). O apoio "decorre da certeza de que investimentos em C,T&I são fundamentais e prioritários para assegurar o desenvolvimento sustentável, econômico e social do País", diz o documento.

Confira a íntegra da nota dos membros do CCT no link: http://www.sbpcnet.org.br/site/arquivos/arquivo_329.doc.

O manifesto pedindo a revisão do orçamento do Ministério foi publicado no jornal Folha de São Paulo, no dia 20 de março, e é assinado por dez entidades, entre elas a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), a Academia Brasileira de Ciências (ABC), a Confederação Nacional das Indústrias (CNI), a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e a Associação Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento das Empresas Inovadoras (Anpei).

Nele as entidades ressaltam que os repetidos cortes e contingenciamentos de recursos destinados à pesquisa científica e à inovação são incompatíveis com os recentes compromissos do governo para manter o status conquistado pelo Brasil, hoje dono da sexta maior economia do mundo e reconhecido como uma nação de liderança global.

"A pesquisa científica e tecnológica é base para inovação e para a formação de recursos humanos qualificados, com impactos significativos no crescimento e na geração de riquezas. Em países vencedores no campo da inovação, o investimento é fruto de aportes relevantes tanto do setor privado quanto do público."

Leia a íntegra do manifesto: http://www.sbpcnet.org.br/site/arquivos/arquivo_328.pdf.

(Ascom da SBPC)

MORRE GILBERTO VELHO



Morre o antropólogo Gilberto Velho

A ABC e grupos de cientistas sociais pretendem homenagear o antropólogo este ano em seus eventos. Colegas destacam seu pioneirismo na antropologia urbana.

Faleceu na madrugada deste sábado (14) o antropólogo Gilberto Velho, aos 66 anos, vítima de um AVC enquanto dormia em seu apartamento, em Ipanema, no Rio de Janeiro. Seu corpo foi velado no domingo (15) no Cemitério São João Batista, e cremado hoje (16) no Cemitério São Francisco Xavier, na Zona Portuária do Rio.

Em nota, a presidente Dilma Rousseff afirma que a "triste perda" do antropólogo "deixa uma lacuna no trabalho coletivo de se pensar o nosso País". "Suas pesquisas enriqueceram as ciências sociais e deram contribuição fundamental para o entendimento do Brasil contemporâneo", lamenta a presidente.

É consenso no meio científico que o trabalho de Velho é pioneiro especialmente na área da antropologia urbana, tanto no Brasil quanto fora. Sua contribuição se deu em áreas como o estudo das camadas médias e elites urbanas, antropologia das sociedades complexas, estudos de transe e possessão, teoria da cultura, antropologia e sociologia da arte, violência e a problemática do uso de drogas, além do papel social e político destas.

"Linha de frente" - Jacob Palis, presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), lembra que Velho foi um dos primeiros a introduzir esses temas modernos numa época em que a antropologia se concentrava no estudo das populações indígenas. "Uma contribuição excepcional, pioneira no Brasil; Gilberto estava na linha de frente das Ciências Sociais", ressalta.

Em 'A Utopia Urbana: um estudo de antropologia social', de 1973, Velho deslocou o foco das pesquisas antropológicas para o cerne urbano da sociedade, baseando-se em entrevistas com moradores de um prédio de Copacabana.

Daniel Simião, secretário geral da Associação Brasileira de Antropologia (ABA), da qual Gilberto Velho foi presidente de 1982 a 1984, conta que sua reflexão sobre "estranhar o familiar e familiarizar-se com o exótico na construção do olhar antropológico", publicada há mais de três décadas, ainda é muito utilizada na formação acadêmica dos antropólogos, "em qualquer disciplina de introdução à antropologia". "É a importância de reconstruir nossos mapas mentais para entender o que nos é familiar, mas não é conhecido. Isso vem da preocupação dele de estudar o que é próximo, que constitui o campo da antropologia urbana. Foi um professor que marcou muitas gerações", lembra.

Velho foi eleito Membro Titular da ABC em 2000, sendo um dos primeiros de área de Ciências Sociais a ingressar na Academia. "Ele colaborou muito com a Academia, sempre muito disposto, muito positivo. Foi muito inesperado", lamenta Palis, destacando também seu apoio à formação de pesquisadores jovens, "de quem cuidava muito".

Atualmente, ele desenvolvia uma pesquisa em Carreiras, Projeto e Mediação em Sociedades Complexas, onde investigava as relações entre vários níveis e domínios da realidade sócio-cultural, assim como processos de construção social da realidade e de definição de situação a partir das tradições interacionista e fenomenológica das ciências sociais. Nos últimos anos, preocupou-se em estabelecer comparações entre o Brasil e outras sociedades, particularmente com Portugal.

Carreira - Nascido no Rio de Janeiro, Gilberto Cardoso Alves Velho graduou-se em Ciências Sociais no Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IFCS-UFRJ) em 1968. Dois anos mais tarde, obteve o mestrado em Antropologia Social no Departamento de Antropologia do Museu Nacional da UFRJ, em 1970. Especializou-se em Antropologia Urbana e das Sociedades Complexas na Universidade do Texas, em Austin (EUA) e concluiu o doutorado em Ciências Humanas pela Universidade de São Paulo, em 1975.

Foi professor visitante e conferencista em universidades como a Columbia University, Berkeley University, Universidade de Utrech e Universidade de Leiden (Holanda), Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa e Museu Nacional de Etnologia de Lisboa (Portugal), Universidade de Goa (Índia), entre outras.

Além da Associação Brasileira de Antropologia, Gilberto Velho presidiu a Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais, ANPOCS (1994-1996). Foi vice-presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) de dezembro de 1991 a julho de 1993, ocupando o lugar de José Albertino Rodrigues, morto em um acidente automobilístico.

Foram mais de 160 artigos publicados em periódicos nacionais e internacionais, além de ter sido organizador e autor de 16 livros. Recebeu da Presidência da República do Brasil a Comenda da Ordem Nacional do Mérito Científico em 1995 e a Grã-Cruz em 2000. Anteriormente, já havia sido homenageado com a Medalha UERJ-40 Anos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (em 1990) e posteriormente com a Medalha Capes 50 Anos, em 2001.

Homenagens em 2012 - A ABC pretende homenageá-lo em sua reunião magna anual, que ocorrerá nos dias 7 a 9 de maio e vai lançar a ideia de um simpósio no fim de 2012 na área de Ciências Sociais em sua memória, durante a reunião Avanços e Perspectivas na Ciência no Brasil, América Latina e Caribe. Por sua vez, Daniel Simião lembra que em julho, durante a 28ª Reunião Brasileira de Antropologia, em São Paulo, "certamente haverá um espaço para homenagear esse grande mestre".

Atualmente, Gilberto era professor titular do Departamento de Antropologia do Museu Nacional, da UFRJ. Ele tinha um histórico de problemas de cardiopatia, era divorciado e não deixa filhos.

(Clarissa Vasconcellos - Jornal da Ciência)
iN: JC e-mail 4477, de 16 de Abril de 2012.